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  • Writer's pictureClau Gazel

A primeira trufa a gente nunca esquece

Vento e temperatura baixa numa quarta-feira de inverno chuvosa e cinzenta em Paris. Um dia não muito promissor, a não ser pela expectativa em relação ao restaurante escolhido, L’Epi Dupin, que já fazia parte da minha lista de desejos parisienses há muito tempo. Bem feliz com os pratos, num clima agradável de fim de refeição e com o restaurante quase vazio, minha amiga e eu seguimos debatendo se pediríamos sobremesa e o que faríamos ao sair de lá. E de repente algo estranho acontece. Pela porta da frente do restaurante entram dois homens, que, como um ímã, atraem todo o staff, incluindo os chefs, para uma mesa coletiva, sobre a qual em poucos segundos todos se encontram debruçados. Disfarço, mas não consigo parar de olhar. Percebo que o assunto é sério. E excitante. Quando abre uma brecha, percebo sacos plásticos passando de mão em mão. Alguma brincadeira de criança? Não! O papo é de gente grande que fala sério e franze as sobrancelhas. E cada um retira algo do saco. E cheira. E tudo se transforma. Prazer. Expressões de puro prazer. E logo se junta a eles uma cliente empolgada que fala, sorri e agradece. Trufas?!?! São trufas fresquinhas! Ha, ha. Eu também quero, reivindico ao garçom. Posso? Sim… tout à fait! E chego tímida. Peço uma. Para fazer o quê? Não sei… mas eu quero! O que devo fazer? O que posso fazer? Risotto ou ovos moles ou Saint-Jacques. Risotto aux truffes!  Vou fazer risoto. E a receita é dada ali mesmo em 2 minutos. Chega a balança da cozinha. 50 gramas. Esse é o peso da minha primeira trufa, meu diamante negro (Tuber Mélanosporum) nascido no Perigórd. Nem dinheiro eu tenho, mas amiga é para essas coisas. E a minha pequena chega até mim embalada a vácuo, junto com as instruções de retirá-la daquela prisão tão logo chegue em casa. Deve ser guardada na porta da geladeira, num pote, deitada sob um papel absorvente. E consumida o quanto antes, para que sejam aproveitadas absolutamente todas as propriedades do seu sabor inigualável. E ela passa às minhas mãos, e dali para minha bolsa. Minha excitação é tanta que ao chegar em casa penso ter esquecido todas as recomendações. Sim, deu branco. Vou para a Internet. Guarde num pote de vidro! Na porta da geladeira! Como logo! Dê uma olhada sempre para garantir que não está se formando uma casca branca! Corro para a geladeira! Olho pra ela e dou uma boa fungada. Ufa. Está pretinha, cheirosa. Olhar sempre? Se eu durmo na cozinha, morro de frio. Se levo a trufa para o quarto, ela morre de calor. Nem posso pensar. Jamais me perdoaria. Às 3h30 consigo parar de delirar e ir deitar. Acordo e corro para a geladeira. Tudo bem, tudo ótimo. E é hoje o dia da alegria. Arroz arborio (200 grs), caldo feito de 4 cenouras, 3 alhos poró, um aipo, bouquet garni e sal. Nada de caldo pronto de caixinha! Algumas echalottes em filetes suam em um pouco de azeite na panela. Em seguida vem o arroz e o vinho branco (1 copo) e ficam ali por 5 minutos. Depois, põe o caldo e mexe, põe mais caldo e mexe e assim sucessivamente até o arroz ficar bom (uns 20 minutos). Manteiga no final (1 colher de sopa grande), com o fogo desligado, para deixar o prato mais suculento e brilhante. E chegou a hora de ralar um pouco de trufa. Mas deixe umas lascas fininhas para colocar por cima. Esse é o risoto que vai ficar para sempre na minha memória. Por que a primeira trufa, a gente nunca esquece.

MINHA TRUFA

A NEGOCIAÇÃOO RISOTO

Para contatar o fornecedor de trufas:  http://www.bellorr.com.

Para experimentar o restaurante L’Epi Dupin (reservas indispensáveis): 11, Rue Dupin; seg – 19/23h; ter/sex – 12/15h e 19/23h; metrô Sevres-Babylone (linhas 10 e 12); http://www.epidupin.com.

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